terça-feira, 14 de abril de 2009

Que tal acender os faróis?

Certos hábitos dos motoristas brasileiros merecem profundos estudos psicológicos. Em alguns, procura-se economia de algo, como o perigoso hábito de descer uma serra com o carro desengrenado ("na banguela"). Em outros, conforto. O "afrouxador" de cinto de segurança é um exemplo. Mas o mais estúpido talvez seja o péssimo, perigoso e, diria ainda, assassino hábito de andar apenas com a "lanterna" ligada.

O hábito de não usar os faróis baixos durante a noite, dentro de um túnel ou garagem, remonta os anos 50. E não se sabe quem resolveu achar que é melhor ver menos e ser ainda menos visto que trocar uma lâmpada de farol de tempos em tempos. Alguns dizem que foram os taxistas, onerados com as trocas dos antigos faróis "sealed-beam" que queimavam a toa com os buracos e geradores não tão estáveis dos carros de outrora. Só há uma certeza. O hábito está profundamente arraigado no motorista brasileiro.

Em muitos países do primeiro mundo, o hábito de acender os faróis de dia fez com que até 90% dos atropelamentos deixassem de acontecer, em alguns locais. Não precisa nem pensar muito: se 100 pessoas morrem atropeladas todo ano, passaram a morrer apenas 10. Seriam 90 mortes desnecessárias, sem falar nos prejuízos emocionais e financeiros para as famílias e motoristas envolvidos em cada acidente. Mas no Brasil o problema nem é acender os faróis de dia. De fato, os motoristas de alguns estados tem o hábito de fazê-lo durante o dia, nas estradas, o que já e alguma coisa.

Mas obrigar os motoristas a trafegarem com farol aceso de dia pode ser resolvido com apenas uma lei, que provavelmente vai "pegar" pois é fácil detectar quem está aceso, quem está apagado e multar, único tipo de punição que o brasileiro tem medo. O problema maior é acabar com esse péssimo hábito, e fazer os motoristas acenderem os faróis A NOITE!

Pode parecer estória de maluco, mas os motoristas brasileiros não trafegam com os faróis ligados nos horários em que eles são mais necessários: a noite! Uns alegam que eles ofuscam os motoristas, o que só é verdade se estiverem em mal estado ou usarem lâmpadas ilegais. Outros dizem que estão economizando bateria e possíveis trocas de lâmpadas. Ora, quem precisa economizar isso não deveria nem ter carro. São aqueles que andam sem pagar IPVA, multas e ignoram os aspectos mais básicos da manutenção de um veículo. Há, ainda, os que alegam que não são necessários, pois a iluminação pública das cidades é suficiente. Façam-me o favor: um dos maiores problemas das cidades brasileiras é a iluminação pública!

Dias atrás, estava em um restaurante situado ao lado de uma esquina movimentada do bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro. Resolvi fazer uma breve e pouco precisa pesquisa anotando pauzinhos no papel da mesa do restaurante... De cem carros "pesquisados", 61, isso mesmo, 61 carros trafegavam apenas com as "lanternas" ligadas, ou seja, nem mesmo com faróis baixos acesos. Entre os notórios motoristas que estão contra a lei estão os taxistas, motoristas de vans e ônibus.

Trafegar com os faróis acesos é algo básico pois permite que o motorista consiga enxergar melhor a via, os pedestres, os outros carros, mas, acima de tudo, permite que o carro que dirigimos SEJA VISTO! As batidas em cruzamentos a noite são comuns pois os motoristas nas vias não-preferenciais avançam sobre o cruzamento para ver se algum carro vem, colocando a frente do carro praticamente no meio. Isso seria muito mais fácil se os carros andassem com faróis acesos. O carro na preferencial seria visto antes e não haveria a necessidade de "colocar o bico" do carro no meio do cruzamento para saber se dá para continuar. E se o carro que tenta sair da esquina estivesse com faróis acesos, o motorista da preferencial não tomaria um susto ao ver alguém tentando pular na sua frente. É basicamente uma questão de ver e ser visto. Ou simplesmente "sentir" que um carro está se aproximando, o que normalmente acontece quando "sentimos" que um carro vem por usarmos nossa visão periférica.

O mesmo vale para shoppings e garagens em geral. Andar com os faróis acesos pode significar ser visto por uma criancinha correndo entre carros estacionados. Há anos atrás um tio bateu forte em um estacionamento de shopping. Os dois carros, o dele e o do sujeito que vinha pela preferencial, estavam apenas com as "lanternas" ligadas. Se estivessem com os faróis acesos, um dos motoristas poderia perceber algo errado décimos de segundo antes do acidente. E, neste caso, houve vítimas não-fatais, mas que carregam até hoje as marcas da irresponsabilidade.

Outra moda comum entre o pessoal dos clubes é ligar as setas (ou piscas) na lanterna, desativando a lâmpada branca dentro do farol. Normalmente a área acesa é menor ainda e, de qualquer forma, não há facho iluminando a pista, paredes, outros carros, algo que facilite a percepção que algo está se aproximando.

Há, ainda, outro fator importante. Com os faróis acesos, os diversos elementos do trânsito (pedestres, motoristas trafegando em sentido contrário, motoristas tentando entrar na via) conseguem definir com mais precisão a distância que o seu veículo se encontra e, consequentemente, avaliar se há tempo suficiente para uma ultrapassagem ou entrada na via. Quantas vezes não estamos trafegando em uma via e alguém tenta "entrar" subitamente na via? Rapidamente piscamos o farol alto e o motorista "entrão" logo para, pois passa a ter uma percepção melhor que estamos trafegando com velocidade grande ou perto demais.

Em túneis, especialmente os das grandes cidades ou de pequeno comprimento, há motoristas que sequer acendem os faróis. Tamanha irresponsabilidade bota em risco nossas vidas e de todos ao redor.

Acreditem: há um projeto de lei, de autoria da deputada Selma Schons, do PT do Paraná, que proíbe o uso dos faróis durante o dia, o que vai contra tudo o que foi provado nas pesquisas internacionais. Mais um bom exemplo da capacidade de nossos deputados e vereadores em legislar sobre algo que vai efetivamente melhorar nossas vidas...

Antes de entrarmos no debate sobre acender as luzes de dia, obrigatório ou recomendado em toda a Europa, Canadá, EUA, Austrália, que tal pensar um pouco sobre acender os faróis À NOITE?

Um par de boas lâmpadas custam R$ 50,00. E acesas por algumas horas, todos as noites, vão durar anos. Apagadas podem trazer conseqüências que podem durar dias, anos ou uma vida inteira.


Julio Cohen